Brasil na contramão das ferrovias

José Manoel Ferreira Gonçalves*

Rápidos, seguros, confortáveis e não-poluentes. Charmosos e sinônimos de pontualidade. Assim são os trens de passageiros na Europa, Estados Unidos, China e Japão, descobertos e admirados pelos brasileiros que viajam ao Exterior. Na Índia, outra nação de dimensões continentais, o trem de passageiros é venerado e consolidado como símbolo de integração nacional. Uma realidade porém que está distante de nosso transporte interno. Aqui, há muito as ferrovias passaram a priorizar dois ou três gêneros de carga, enquanto o embarque de passageiros em distâncias médias e longas saía de cena.

O mundo inteiro se preocupa com ferrovia de passageiros, menos o Brasil, que só pensa em carga. Qual a razão disso?

Basta percorrer a reduzida lista de concessionárias de linhas férreas para entendermos um pouco melhor esse quadro absurdo de total abandono do trem para locomoção humana no país. Existe praticamente um duopólio, compartilhado pelas empresas Rumo e Vale, voltadas quase que exclusivamente ao transporte de grãos e minério de ferro.

O último sopro de retomada da vocação dos trens para conectar as pessoas em nosso vasto território aconteceu no início do governo Dilma 1, quando alguns projetos foram ventilados, como a ligação entre Brasília e Goiânia e o sempre cogitado trem entre Campinas e o Rio de Janeiro. Mas nada saiu do papel.

Já à época se cogitou a modalidade das PPPs para viabilizar investimentos. Porém, o tabuleiro da presença privada nas ferrovias brasileiras permaneceu sob o domínio de quem pouco se importa com o papel dos trens na mobilidade.

Vários são os reflexos dessa deterioração do trem de passageiros no cenário local: a dependência de rodovias, gargalos na infraestrutura urbana, a proliferação de pedágios e a elevada poluição gerada pela queima de combustíveis fósseis.

O resultado desse descaso foi uma década marcada por greves de caminhoneiros que paralisaram também o transporte de pessoas, a escalada da violência e mortalidade no trânsito. Mesmo em áreas urbanas, onde o trem participa do esforço de mobilidade, o transporte de passageiros está longe de ser satisfatório.

Precisamos nos reencontrar com nossos trens e voltar a admirá-los. A chegada de um governo federal mais preocupado com pessoas e seu bem-estar pode ser o ponto de partida para o  Brasil sair da contramão e retomar o caminho certo para o transporte de passageiros sobre trilhos.

José Manoel Ferreira Gonçalves é engenheiro e presidente da FerroFrente, Frente Nacional pela Volta das Ferrovias.

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